Clara Luz é uma fada que quer fazer o mundo andar por suas próprias ideias.
Para ela, quando ninguém inventa nada, o mundo fica parado.
Incluído na Bibliografia Seletiva de Literatura Infantil, da Unesco, no Ano Internacional do Livro (1972).
Indicado como uma das cinco melhores obras infantis brasileiras de 1967 a 1971.
O livro narra a história de Clara Luz, uma fadinha que vive na Via Láctea, e como o próprio título do livro já diz, é cheia das idéias, e das mais “subversivas”, para o horror de sua mãe, sua professora, e principalmente da Rainha das Fadas.
A história é de uma delicadeza e sensibilidade marcantes, ao mesmo tempo que oferece um humor leve e inocente, como é típico nos livros infantis.
Outro ponto forte desse belo livro, são as lindas aquarelas que ilustram a história.
Clara Luz era uma fadinha, de seus dez anos de idade, que morava no céu com a Fada-Mãe. Vermelhinha, a estrela, e Amarelinha, a gota de chuva eram suas melhores amigas.
Clara Luz parecia uma fada comum, exceto pelo fato de ter muitas ideias e opiniões.
A fadinha não gostava de seguir as emboloradas lições do Livro de Fadas e criava suas próprias mágicas.
A Fada-Mãe ficava muito triste e preocupada com a desobediência da filha e não conseguia fazer com que a menina passasse da primeira lição do livro.
A zelosa mãe temia a punição da Rainha das Fadas.
Por diversas vezes, teve que reverter ou anular as mágicas da travessa menina.
Como exemplos, a vez em que a fadinha inventou um passarinho com três asas, o dia em que Clara Luz não seguiu corretamente a receita de bolinhos de luz e a massa cresceu tanto que escorreu até a Terra…
A jovem fada justificava-se afirmando que “quando alguém inventa alguma coisa, o mundo anda. Quando ninguém inventa nada, o mundo fica parado”.
Durante uma de suas invenções, a menina convence sua mãe de que seguir as mágicas do livro era muito monótono e que isso todas as fadas poderiam fazer.
O interessante era inovar, ou seja, realizar mágicas novas.
Entretanto, ao nascer do novo dia, a Fada-Mãe voltou atrás em sua decisão por imaginar que poderia estar sendo um mau-exemplo para a filha.
Após inúmeras peripécias, Clara Luz e todas as fadas do céu foram convocadas a comparecer ao palácio da Rainha das Fadas para justificar, entre outras coisas, a invasão dos animais à sua nobre residência e o conteúdo do bilhete enviado pela Bruxa Feiosa, que reclamava sobre o colorido da chuva que caíra na Terra.
As fadas tinham verdadeiro horror ao que a Rainha poderia fazer ao descobrir a verdade e acabaram, quase que em sua totalidade, desmaiando. Clara Luz, muito corajosa, explicou a causa de todos os “fenômenos” (suas próprias travessuras!) à majestade, que sentiu-se muito orgulhosa pela inteligência da garotinha e acabou nomeando-a Conselheira-Chefe do palácio das fadas.
Não é exagero afirmar que se trata de um livro maravilhoso.
Destinado às crianças, causa alegria e prazer aos leitores de todas as idades.
No enredo, uma fadinha, Clara Luz, não se cansa de exercer as habilidades de um ser de muita curiosidade benigna e criatividade incessante.
Ela torna alegre e surpreendente a sua e a vida de todos que a rodeiam.
Clara Luz é aliada da verdade, da insubmissão – com causa – e da inspiração que resulta em beleza, a cada toque de sua varinha de condão.
A fada inovadora faz chover colorido; prepara iguarias, como os bolinhos de luz; convence sua professora de Horizontologia a conhecer de perto os horizontes novos que anseia revelar. Mas Clara Luz faz mais, muito mais.
A protagonista de A fada que tinha ideias é também, simbolicamente, porta-voz do antiautoritarismo: seja por não se ater às obrigatórias receitas de mágica do Livro das Fadas, seja por nunca temer a rabugenta Rainha das Fadas, que tratava suas súditas com rédea curta.
A própria autora escreveu o livro originalmente num período em que o manto da ditadura militar encobria a realidade brasileira.
Naquela época, uma delicada fadinha como Clara Luz podia ser acusada de subversiva e até mesmo encarcerada.
A fada que tinha idéias foi publicada em 1971. Agora, em sua 27ª edição, ficou, nas palavras da autora, “muito bonita, mais colorida ainda, portanto mais parecida com o mundo de Clara Luz, que é um mundo de alegria”.
A fadinha não faz por menos: transforma positivamente o reinado que habita e inunda de felicidade o coração de seus admiradores.
Trecho do livro
Clara Luz era uma fada, de seus dez anos de idade, mais ou menos, que morava lá no céu, com a senhora fada sua mãe. Viveriam muito bem se não fosse uma coisa: Clara luz não queria aprender a fazer mágicas pelo livro das fadas.
Clara Luz queria inventar as suas próprias mágicas.
− Mas minha filha, todas as fadas sempre aprenderam por esse livro− dizia a Fada Mãe. Por que só você não quer aprender?
− Não é preguiça, não, mamãe. É que não gosto de mundo parado.
− Mundo parado?
− É que quando alguém inventa alguma coisa o mundo anda. Quando ninguém inventa nada, o mundo fica parado. Nunca reparou?
− Não...
− Pois repare só.
A Fada Mão ia cuidar do serviço, muito preocupada. Ela morria de medo do dia em que a Rainha das Fadas descobrisse que Clara Luz nunca saíra da Lição Um do Livro.
A rainha era uma velha fada muito rabugenta. Felizmente vivia num palácio do outro lado do céu. Clara Luz e sua mãe moravam numa rua toda feita de estrelas, chamada Via Láctea. A casinha delas era de prata e tinha um jardim todo de flores prateadas.
Minha filha faça uma forcinha, passe ao menos para a Lição Dois! − pedia a Fada Mãe, aflita.
− Não vale a pena, mamãe. A Lição Um é tão enjoada, que a dois tem que ser duas vezes pior...
− Mas enjoada por que se ensina a fabricar tapete mágico...
− Já pensou que maravilha saber fazer um tapete mágico?
− Não acho não. Tudo quanto é fada só pensa em tapete mágico. Ninguém tem uma ideia nova!
Clara Luz estava sempre fazendo experiências com sua varinha mágica. Já de manhã cedo, reparava no bule de prata, olhava para ele e tinha uma ideia:
− Tem bico. Dá um bom passarinho.
E transformava o bule em passarinho, mas, o passarinho saía com três asas, duas novas e a do bule que tinha sobrado.
A Fada Mãe entrava na sala e levava um susto danado
− Que bicho esquisito é esse?
− É o bule, mamãe, que eu transformei em passarinho.
− Clara Luz! E agora? Onde vou coar o pó da meia noite para fazer o nosso café? E que ideia é essa de fazer passarinhocom três asas? Ao menos ponha só duas asas nele!
− Mas mamãe, ele gosta de ter três asas!
O passarinho furioso entrava na conversa:
− Não gosto não senhora! Faça o favor de me consertar já!
Clara Luz não acertava e quem acabava consertando era a Fada Mãe e o passarinho agradecia muito:
− Se não fosse a senhora eu não sei como seria! Essa sua filha é muito intrometida. E saía pela janela resmungando ainda.
− Veja só inventar que eu gosto de ter três asas!
Mas essas eram as ideias menores de Clara Luz. Havia outras bem maiores.
A maior amiga de Clara Luz era Vermelhinha, uma estrela cadente e por ser cadente Vermelhinha podia ir onde queria no céu. Ela e Clara Luz corriam sem parar brincando de esconder atrás das nuvens.
− Minha filha, porque você não arranja uma amiga mais calma, heim? − perguntava a Fada Mãe, às vezes muito tonta com as travessuras de Clara Luz e Vermelhinha.
Mas perguntava por perguntar, pois gostava muito de vermelhinha. Tanto que, no aniversário da estrela resolveu dar uma festa.
Vermelhinha ia fazer nove milhões de anos, o que para uma estrela é bem pouco.
Clara Luz, que adorava festas, estava felicíssima, ajudando a mãe muito direitinho que justamente na véspera da festa teve que sair para desencantar uma princesa.
− Não faz mal − disse a Fada Mãe − Está tudo quase pronto. Você pode ir fazendo a massa dos bolinhos de luz, enquanto eu vou ver a tal princesa. Acho que já sabe fazê-los sozinha.
− Sei fazer muito bem.
− Ótimo! Amanhã cedo faço o bolo de aniversário. É só o que está faltando.
E a Fada Mãe abrindo suas asas cor de prata saiu voando pela janela, então Clara Luz correu para a cozinha e abriu o livro de receitas na página dos bolinhos:
Bolinhos de Luz
250 g de raio de sol
250 g de raios de luar
1 c de chá de fermento de relâmpago
Maneira de fazer:
Misturam-se bem os raios de sol e de luar, até saírem faíscas.
Junta-se então o fermento de relâmpago.
− Que fácil! − pensou Clara Luz. − Não sei como certas pessoas podem achar difícil fazer bolo!
E foi tirando os raios de sol e de luar dos potes onde estavam guardados, nas prateleiras. Despejou tudo num tacho e mexeu, como a receita mandava. A cozinha inteira começou a brilhar, faiscar e fazer barulho.
Quando chegou a hora do fermento, Clara Luz teve uma ideia:
− Fermento é que faz o bolo crescer. Se em vez de uma colher de chá, eu puser um relâmpago inteiro, vai sair um bolão enorme. Mamãe amanhã nem vai precisar fazer o bolo das velas.
É claro que não havia relâmpago inteiro em casa. Clara Luz não se atrapalhou:
− O jeito é eu ir para a janela e pescar o primeiro que passar.
Mas não foi fácil. Nenhum relâmpago concordava em entrar no bolo:
− Eu não, ora essa! Tenho mais o que fazer!
Afinal passou uma família inteira de relâmpagos: pai, mãe e cinco filhos. Ninguém deu confiança à Clara Luz mas, o menor de todos, um relampagozinho muito esperto ia ao fim da fila.
− Pssiu! − chamou Clara Luz. − Você quer entrar no meu bolo?
− Eu não, que não sou bobo. Pensa que quero ser comido em festa de aniversário?
− Clara Luz pensou um pouco:
− Você entra e depois sai. É só para fazer o bolo crescer.
O relampagozinho começou a gostar da ideia:
− Puxa! Deve ser divertido mesmo...
E aí a confusão ficou do tamanho certo!
E aí a confusão ficou do tamanho certo!
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